domingo, 6 de novembro de 2011


Desca do muro e viva.



“Nada mais insuportável do que gente que não diz o que sente. Ou que não sente e não diz. Tenho impulsos de esganar aqueles que demonstram tanta emoção quanto um sapo ornamental, com cara de paisagem e um sorrisinho indecifrável grudado na fuça. Amigo do peixe e camarada da isca. Escorregadio.
Não dá pra confiar em quem se dá bem com todo mundo. Parto da premissa que quem é amigo de todos não é verdadeiramente amigo de ninguém. Isso é só insegurança travestida de simpatia, uma baita necessidade de aceitação. Um tanto patético em se tratando de adultos, vamos convir. Da mesma forma, não boto nem um tiquinho de fé em homem que se dá fenomenalmente bem com todas as suas ex-namoradas, é sinal de que não se envolveu efetivamente com nenhuma, de que é tão raso e auto-resguardado que sai dos relacionamentos como se tivesse saído do cabeleireiro: impecável. Pessoas assim acham mais importante continuar sendo gostadas do que amar, se entregar, e correr os riscos que isso envolve. Inclusive o de serem odiadas.
Por isso, quase nada (a não ser a ausência prolongada de orgasmos) é tão decepcionante, esfrangalha tanto os nervos de uma mulher como dividir a vida com um equilibrista, um morde-e-assopra. Está além das fronteiras do frustrante: dar atenção, deixar de dar atenção, brigar, fazer as pazes com sexo tântrico. Nenhum surto, nenhum grito, nenhum beijo, nenhum riso largo e sonoro. Tudo sempre é morno. Sempre aquele irritante, imbecil, pseudozen sorrisinho incógnito.
Confesso minha inaptidão para compreender esse cruzamento de sentimentos de estátua com feições de garoto-propaganda de pasta de dente: gosto ou não, sem meio-termo. Não existe esse troço de “estado de suspensão amorosa” – até porque, se fulano não faz diferença na minha vida, está automaticamente fora dela. Desde pequena, aprendi que o que não se usa deve ser jogado fora para abrir espaço para o novo. Por isso, acho impossível entender essas pessoas para as quais as outras são como queijo ralado em pratos gratinados: se tiver, “oba, que delícia!”; se não tiver, não faz diferença. Se não é pra se molhar, pra que raios entrar na água?
Passionalidade é o que difere as relações humanas do cruzamento das minhocas e do namoro das iguanas. Quem passa pelo outro sem se intoxicar dele deixou de viver para se preservar e vai ganhar o que com isso? Histórias recheadas de momentos maravilhosos? Lembranças divertidas? Não, só vai perder: perder o próprio tempo e desperdiçar o do outro, privá-lo de viver com 100% da capacidade. Paixão de verdade, daquelas que valem a pena gozar, deixa vestígios. Qualquer coisa vivida por inteiro deixa vestígios: boa comida só é preparada sujando panela, quadros só viram obras-primas depois de muita tinta ter encardido as mãos do artista.

Amar, para mim, é como comer manga: o prazer é diretamente proporcional à lambança e ao tempo em que se demora para tirar os fiapos. E daí se mancha? Tudo na vida tem seu preço. E algumas valem cada centavo. Pague prá ver.


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